À conquista dentro e fora de campo


O futebol feminino sobe ao palco da Liga BPI este fim-de-semana com a primeira jornada do campeonato e este foi o timing certo para conhecer de perto uma realidade que hoje se impõe no panorama do futebol nacional. É que este futebol já não é para “marias-rapazes”, longe disso. As mentalidades mudaram e continuam a mudar e as atletas olham para um futuro em que profissionalizar será inevitável para continuar uma evolução que nem a pandemia travou. “O futebol feminino tem vindo a crescer imenso, até porque o objetivo da Federação passa por profissionalizar os clubes, mesmo em realidades como a nossa. Não tenho grandes dúvidas que dentro de poucos anos, o clube terá de mudar a perspetiva e olhar para a profissionalização total da equipa”, explica Nuno Pereira, treinador da equipa de futebol feminino do Valadares Gaia, que este domingo recebe o Varzim. Os próximos passos só poderão ser dados com investimento de meios. “Precisamos de estruturar, porque para sobreviver este passo terá de ser dado, se calhar mais depressa do que pensam, porque o futebol feminino está a evoluir de tal forma, que está a reivindicar cada vez mais um espaço que é seu de pleno direito”, acrescenta.

Duas cadeiras ao lado, Raquel Gomes, central da equipa, justifica as palavras do mister com a realidade com que as jovens se debatem diariamente: “Muitas jogadoras trabalham, outras estudam e os treinos são ao final do dia, acabam tarde e no dia a seguir voltamos ao mesmo e isso é tudo muito desgastante. O rendimento não é o mesmo. Aos domingos temos de abdicar da família para estar no futebol, se calhar é preciso quereremos muito mais isto, do que no masculino, porque temos muitos obstáculos. É preciso que se criem condições para que daqui por uns anos uma jogadora não passe pelos mesmos problemas que enfrentamos hoje”.

Na época passada, o Valadares Gaia terminou no 10º lugar da geral e em 1º da série Norte da fase de manutenção e domingo vai a jogo contra o Varzim. “O primeiro jogo traz sempre alguma ansiedade. Quem chega quer mostrar-se e quem cá está também quer mostrar que está na luta. Mas é fundamental tentar ganhar, até porque depois é sempre mais fácil trabalhar em cima de uma vitória do que em cima de uma derrota. Jogamos em casa e frente aos nossos adeptos queremos dar uma boa imagem, pelo que não há nada melhor do que entrar a ganhar”, comenta Nuno Pereira.

Do outro lado, o mister Roger Pinheiro tem nas mãos um projeto que vai apenas no segundo ano de existência, mas já alcançou a Liga BPI. O Varzim subiu sem ter tido tempo para consolidar o trabalho da primeira temporada e, naturalmente, a experiência do treinador da equipa poveira fala mais alto. “Aconteceu e só temos de aproveitar, como é óbvio, mas este projeto ainda tem pouca estrutura”, explica. Só do Braga chegaram oito reforços da formação, pelo que a equipa é muito jovem. “Fui treinador do Braga no futebol feminino e conheço bem o trabalho que está por trás, já tinha trabalhado com quase todas as atletas na formação, conhecia o potencial delas”, justifica, sem esconder que o Varzim será certamente a equipa com menor orçamento desta Liga. “Esta é uma época fundamental para as nossas atletas, apesar de tudo, porque vão ser extremamente desafiadas. A dificuldade vai estar presente, mas é o que as vai fazer evoluir e transformar em melhores jogadoras. Daqui a duas ou três épocas, com este plantel poderemos jogar confortavelmente numa I Divisão”, garante.

Carocha é o exemplo acabado daquela que tem sido a política do Varzim. A jogadora veio para o Varzim na época passada e aos 18 anos joga no meio-campo: “As jogadoras que vieram este ano têm muita vontade de jogar na Liga BPI. Acredito no projeto e apostei no Varzim para crescer e atingir patamares ainda mais altos. É um projeto recente, mas que nos dá condições, apesar de tudo”.

Domingo é dia do primeiro duelo com o Valadares. “Houve uma mudança no Valadares, apostaram mais forte, têm várias atletas estrangeiras e foram buscar jogadoras mais experientes. Naturalmente que não queremos ser o saco de porrada desta Liga. Talvez esta subida não tenha surgido no momento certo, porque não houve tempo para consolidar o que quer que fosse num ano. Mas vamos trabalhar e dar o nosso melhor em cada jogo”, confia Roger Pinheiro. “Sinto-me bastante motivada e ansiosa pelo primeiro jogo na Liga BPI, espero que seja uma boa estreia, porque vamos ter mais visibilidade”, acrescenta Carocha. “É uma estreia, mas se queremos sonhar temos de trabalhar e pensar no que podemos ser diferentes para trazer alguma surpresa ao jogo. As nossas adversárias são mais experientes. Mas acreditamos no nosso processo e queremos surpreender com bom futebol e se tivermos oportunidade para marcar e ganhar, aproveitar. Vamos tentar valorizar o que temos”, finalizou o treinador do Varzim.